Os Idosos também são gente

Abandono na velhice

23-04-2010 18:17

                          Abandono na velhice


“Não é possível fazer frente aos males e desencontros de uma época como a nossa - tais como a falta de sentido para a existência, a despersonalização e a desumanização - a não ser que a dimensão humana, a dimensão dos fenómenos humanos seja incluída no conceito de homem (Viktor E. Frankl).”

     Propôs-se a produção de um texto sobre abandono na velhice, com base na percepção que idosos domiciliados e institucionalizados possuem sobre o abandono. A partir das concepções dos entrevistados, oriundas de seu imaginário e de suas experiências de vida, estruturou-se a análise interpretativa das respostas dadas às duas questões norteadoras do presente estudo, com vistas a auxiliar a compreensão do tema, a colaborar com a reflexão sobre as perguntas relacionadas ao envelhecimento humano e a subsidiar novos estudos.
Para dar cumprimento ao proposto e garantir uma configuração mais abrangente no que se refere à compreensão acerca do abandono, buscou-se identificar os significados atribuídos, por idosos provenientes de diversas condições sociais, a essa problemática. Foram os sentimentos e as sensações expressas pelos entrevistados que construíram o corpus deste estudo.
  

        As categorias foram construídas a partir da leitura interpretativa das respostas dadas às questões norteadoras das entrevistas. Dessas respostas, originaram-se cinco categorias: sozinho, ser deixado de lado, sofrimento, perdas e sem cuidador. A primeira aglutinou as expressões estar sozinho, desamparado, desprotegido e solidão. A segunda envolveu manifestações que referiam a ser esquecido, deixado pelos filhos, deixado de lado, desvalorizado, desconsiderado, isolado, negligenciado, afastado da família, excluído. A terceira categoria, sofrimento, integrou o sentir tristeza, sofrimento, necessidades, maus-tratos, injustiça, crueldade e ruindade. A quarta abrangeu o sentimento de ter perdido o amor dos filhos, autonomia, laços de família, independência, liberdade, amigos e amor. A quinta abarcou o ficar, expresso nas falas que se referiam a sem cuidador, desalistado, dependente e asilado.


        O resultado do estudo realizado traduz, da forma mais fidedigna possível, a exploração qualitativa das falas dos idosos, cujos conteúdos foram categorizados, descritos e interpretados com o intuito de dizer o que os idosos entendem por abandono na velhice e que circunstâncias podem provocá-lo. Nesse proceder, constatou-se que os idosos buscaram situações concretas para tentar explicar o que entendiam por abandono, descrevendo as condições em que ele se manifesta, sobrepondo-se as respostas das duas perguntas formuladas. As falas transcritas no texto evidenciam a reciprocidade entre condição e sentimento, mostrando que ambos estão sempre intimamente relacionados e que um não se dá sem o outro.

 

O CONTEXTO DO ABANDONO ·       

 A discussão sobre o tema abandono foi tratado em momentos distintos, com fins de responder a duas questões essenciais do estudo: “O que você entende por abandono?” e “Em que situação uma pessoa se sente abandonada?”. As duas questões foram os elementos norteadores da indagação e expressam a inquietação sobre o assunto.


        A primeira pergunta teve a intenção de delinear um conceito de abandono na velhice; e a segunda, identificar em que situações reais o abandono se configura, em que contexto ele se dá. A inter-relação de circunstâncias que acompanham a concepção de abandono na velhice espelha uma relação intrínseca de um verbo – ser, estar, ficar, sentir, ter – com os substantivos sozinho e solidão. Isso significa sofrer a ação originada da situação sozinho, o que leva ao sentimento de solidão.
       

        As situações que levam ao abandono são provocadas pela condição de fragilidade do idoso, que pode passar a depender de outras pessoas, pela perda da autonomia e da independência, pelo esfriamento dos vínculos afetivos e pela conduta do grupo de relações ou ausência dele. Ainda há situações que dependem do próprio idoso, no que se refere ao modo como se dá o enfrentamento dessas situações. Isso significa dizer que uma mesma situação pode ser motivo gerador do sentimento de abandono para uma pessoa e não o ser para outra. Depende das circunstâncias objetivas e subjetivas de cada indivíduo.
 

        A partir das falas dos idosos entrevistados, entendeu-se que abandono na velhice é um sentimento de tristeza e de solidão, provocado por circunstâncias relativas a perdas, as quais se refletem basicamente em deficiências funcionais do organismo e na fragilidade das relações afetivas e sociais, que por sua vez conduzem a um distanciamento, podendo culminar no isolamento social.
Abandono é um sentimento de sofrimento trazido por essas circunstâncias, o que impede o indivíduo de viver e conviver plenamente e de permanecer inserido na família, no grupo e na cultura. Essa situação rompe o contacto vital com o mundo, favorece a inércia do corpo e rouba a possibilidade de ser e de conhecer. O estar indefeso, a falta de intimidade compartilhada e a pobreza de afectos e de comunicação tendem a mudar estímulos de interacção social e de interesse com a própria vida. Aparentemente, o idoso espera ser salvo desse sentimento; espera que seu grupo o acolha e com ele permaneça até a morte. Será a morte o abandono maior? O idoso quer em vida o acolhimento, a presença, o amor dos seus. Ele quer compartilhar a experiência e o conhecimento que construiu ao longo de sua existência. Quer entender as contradições que o envolvem, o porquê da distância emocional entre as pessoas de seu grupo familiar e social e seus sentimentos, o que o separa dos outros no momento em que precisa ser apoiado para a travessia que envolve o processo da morte.


        O sentimento de abandono é aqui entendido como uma experiência afetiva, íntima, emocional. Uma reação individual que depende da história de cada um, provocada por uma condição ou circunstância.


        O ser humano teme as perdas, uma vez que as mesmas habitualmente trazem sofrimento. A experiência de perdas pode levar a esclarecer uma situação de abandono. As perdas se revelam como condições desencadeados de um processo que se dá num continuam de maneira gradativa e que se intensifica pelas sucessivas perdas e danos. O aprisionamento nessa situação o fragiliza e o coloca numa condição de dependência, de inutilidade e de aniquilamento. Para muitos, a perda maior é a morte. Aceitar o limite imposto pela morte como experiência quotidiana implica aceitar as regras da existência, visto que a morte impõe uma ruptura com tudo o que se conhece e se ama e faz parte da condição humana.


        A falta de preparo para a morte impede que se compreenda a razão dessa situação irreversível e verdadeira, visto que a sociedade ocidental prepara o ser humano para a vida. A valorização dessa cultura retrata o despreparo do homem para a vida interior, e esse despreparo se manifesta principalmente em situações de impotência frente às perdas. Muitas filosofias de vida “vêem a morte não como um evento isolado, mas como uma mudança no infindável ciclo de mudanças” (Ri ponche, 1987, p. 7).


        O despreparo para viver as diferentes etapas do ciclo de vida mostra que há falta de conhecimento, e que cada etapa exige do ser humano a compreensão de que “cada fase da vida representa algo de novo, que não foi vivido anteriormente e que o homem é um outro” (Guardini, 1990, p. 8). A falta dessa compreensão indica que nem sempre o ser humano tem condições de entender e acompanhar as mudanças que lhe são impostas. A preparação é disfuncional à realidade, e as instituições que são responsáveis pela preparação estão desactualizadas e desfocadas da tensão que existe entre o ser da pessoa e a evolução de suas fases sucessivas, bem como do objectivo maior que é a realização plena da natureza humana.


A PERCEPÇÃO DOS IDOSOS
        O entendimento de abandono na velhice, sob o olhar dos idosos entrevistados, relaciona-se à ideia de sozinho: ser sozinho, estar sozinho, ficar sozinho, sentir-se sozinho e de não ter. Ser sozinho, como algo constitutivo, intrínseco, permanente do ser humano; estar sozinho, como algo que pode ser transitório, passageiro; ficar sozinho, como uma circunstância de perda, como deixar de ter o que já teve; sentir-se sozinho, como experiência emocional de sentir, de ter um sentimento; não ter, como ausência ou privação de alguém ou alguma coisa.
 

        Com esses significados, abandono é ser sozinho no mundo, estar só, sem ninguém para partilhar a vida, para auxiliar durante a velhice. É ficar só pela perda de companheiro, filhos, familiares ou amigos. É sentir-se sozinho, ainda que rodeado de seres humanos, pela falta de um bem-querer espontâneo e sincero, de carinho, de amor dos filhos, do aconchego da família, da intimidade com o outro. É não ter ninguém por si. É não ter a presença dos familiares, de amigos, de companhia, de visitas. É não ter filhos, não ter nada.


Expressões dessas constatações são reveladas da seguinte forma:
“Eu sou sozinho no mundo, não tenho família, não conheço minha família. Me criei fora da família” (J. D., 84 anos, institucionalizado).
“Eu me sinto abandonado porque da família sou só eu, não existe outro no mundo dos estranhos” (J. D., 84 anos, institucionalizado).
“(O abandono) É um sentimento de uma pessoa largada, esquecida, que não tem mais ninguém a não ser a si mesmo” (V. P., 67 anos, domiciliado).

 

        Sozinho, com qualquer de seus significados, pode conduzir à solidão, e esta ao abandono. A solidão e o abandono constituem pesados fardos para os idosos, pois as famílias tendem, não raro, a excluir aqueles tidos como incómodos demais. Também há pessoas que, por suas vivências e experiências, possuem o sentimento de abandono ao longo da vida, não somente na velhice.


Esse significado é manifestado nas seguintes falas dos idosos:
“Para muitos a velhice se torna um fardo pesado, pois o idoso não raro sofre da solidão que os outros lhe impõem ou que ele impõe a si mesmo, daí os sentimentos de melancolia e de desânimo que podem invadir o coração dos idosos”. (F. P., 83 anos, domiciliado).
“Sinto solidão, às vezes, quando estou sozinha em dias de chuva, principalmente à noite. Mas o abandono é muito pior do que a solidão” (I. B., 81 anos, domiciliada).
“Eu sinto solidão, principalmente à noite, quando não tenho com quem conversar e fico com minhas lembranças” (M. S. L., 70 anos, domiciliada).
“Abandono é ser deixado de lado, sem vida própria, sem qualidade de vida, sem poder resistir à solidão” (F. P., 83 anos, domiciliado).

 

        Ser deixado de lado, ser ignorado provoca o sentimento de abandono. Esse sentimento pode se revelar no seio da família e no meio social, e ser provocado pela fragilidade das relações, negligência, perdas afectivas, doença ou ausência de trabalho.
 

        A família é o meio natural de inserção do ser humano. Quando há ausência ou rompimento dessa inserção, o idoso vive uma situação de não-pertencimento, sente-se ignorado, desvalorizado, excluído. A família é a esperança do idoso como forma de manutenção das relações familiares e das possibilidades de evitar o isolamento. Como a família é o grupo através do qual o ser humano é gradativamente inserido no mundo, ela representa o vínculo do indivíduo com a sociedade. Dessa maneira, carrega valores que sustentam essa relação de estar com, de estar junto. Além dos valores humanos que o grupo tem a responsabilidade de reproduzir, ele se constitui ainda no espaço de ligação entre os seus membros. A família pode ser uma solução para evitar o sentimento de abandono, mas não garante necessariamente que esse sentimento não exista. Pelo contrário, depende dos vínculos estabelecidos ao longo da vida e da força dessas relações.


        A família é o primeiro referencial de socialização e de estabelecimento de vínculos, sendo responsável pelo equilíbrio físico, psíquico e afectivo. Segundo o IBGE, a família é vista como um conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica, normas de convivência, que residem na mesma unidade domiciliar. O idoso espera da família que ela o mantenha e cumpra com o papel estabelecido pela sociedade, mesmo que conheça sua família e saiba de seus limites. Crê que esse grupo social seja o seu mantendo final e que possa lhe dar a atenção necessária para enfrentar as agruras que a vida impõe. Essa crença é fortificada pela intensidade das relações pessoais estabelecidas com o grupo familiar.
 

        Quando da inexistência ou fragilidade de laços afectivos, quando da falta de amor, de perguntas sem respostas, de conversas sem atenção, o idoso é deixado de lado por filhos, familiares e amigos. Sua presença participativa, cooperativa e operativa é ignorada, não há convívio familiar, não há espaço para partilhar – dar e receber atenção. A oportunidade de integração lhe é negada; fica sem apoio e carinho, sentindo-se negligenciado afectiva e socialmente. É estar velho sem conviver quotidianamente com a família. Essa condição pode levar aos seguintes questionamentos: como foram construídas as relações familiares ao longo da trajectória de vida desse idoso? Que vínculos foram estabelecidos e mantidos entre ele e seus familiares? Por que esse idoso está sendo sujeito à condição de abandono? Que motivos levam a família a deixar seu idoso de lado e a isolá-lo do convívio familiar?
 

        As falas dos idosos entrevistados remetem à busca de apoio da família, de amigos, e da rede de parentesco quando necessitam de auxílio e se vêem sozinhos, desencantados do mundo, e do que construíram no percurso do seu estar no mundo. Esperam da família o retorno do que por ela fizeram. Esperam que ela resolva os problemas que são incapazes de solucionar devido a suas condições actuais. As expectativas não correspondidas provocam frustrações, tristeza, doenças e, em muitos casos, são motivo de morte.


A esse respeito destacam-se os depoimentos a seguir:
“É ouvir dos filhos e do marido: eu não te quero mais” (A.T.,78 anos, institucionalizado).
“(Abandono) é ser deixada de lado, mesmo pela família. Não receber ninguém, nem filhos, nem amigos, nem atenção. É não ter voz activa. Às vezes as pessoas mesmo se abandonam, por acharem que não têm mais valor, que não servem mais para nada. Não é ganhar um presente, mas receber atenção, perguntar: como vai?” (I. B., 81 anos, domiciliada).

 

        Diante dessas afirmações, o abandono é concebido como sentir-se desamparado no meio dos outros, é não estar bem, é não ter ajuda de ninguém, é andar de um lado para o outro. É ter família e não ser protegido por ela, esquecido, isolado, indiferente, não ser valorizado e não receber atenção. O idoso espera daquele que quer bem o apoio necessário para enfrentar a velhice. Talvez esse bem-querer não seja recíproco e possa produzir o sentimento de abandono. O idoso cansa de falar e não ser ouvido, e essa surdez o deixa afastado de suas esperanças e de seus desejos. À medida que suas expectativas não se realizam e se perde a motivação da espera, ele fica sem o sentido de viver.


Esse significado é expresso da seguinte forma:
“O abandono talvez seja o sentimento mais cruel que o ser humano possa sentir, pois a indiferença de um amigo, do amor de um filho, de um parente faz com que a pessoa perca o sentido da vida. A gente precisa de estímulo do amigo, da valorização de um filho e da compreensão de um parente” (N. L., 66 anos, domiciliado).
“A pessoa se sente abandonada quando o mundo lhe é indiferente, quando não é escutada, quando sua opinião não é valorizada, quando suas necessidades não são atendidas, quando não tem vez nem voto” (N. L., 66 anos, domiciliado).

 

        O campo das relações afetivas pode ser restringido pela perda de companheiro, filho, amigo, o que provoca a sensação de abandono, mesmo que transitória, por não ter com quem partilhar a vida.
 

        A perda das forças, o surgimento de doenças, as dificuldades para estabelecer e manter um diálogo e acontecimentos que podem colocar o idoso numa situação de necessidades e de abandono. São agravantes dessa situação o fato de não ter condições de saúde para manter relações sociais fora do seu meio familiar e as dificuldades financeiras.
 

        Da mesma forma, a dependência, que gera a necessidade de cuidados especiais e de auxílio para a realização das actividades de vida diária, pode fazer com que o idoso seja deixado de lado pelos familiares, sem que lhe seja dispensada a atenção necessária. Por algumas situações como essas, o idoso é afastado da família e colocado numa instituição de longa permanência.


As verbalizações com relação a essas situações são as seguintes:
“O asilamento é uma forma de abandono, porque o idoso fica lá, cuidado por estranhos, sem elo familiar, sem o amor dos familiares. O asilo protege, mas não da forma real, aquela que o idoso quer” (D. H. B. M., 77 anos, domiciliada).
“Abandonar os pais num asilo é não reconhecer o que fizeram para dar a vida para os filhos e nem recompensar o que fizeram por eles” (A. P., 81 anos, domiciliada).
“Ser jogada numa casa de idosos é uma situação muito desagradável. Afinal, ela criou os filhos, fez o melhor que podia fazer e depois é largada num asilo” (R. T., 76 anos, domiciliada).

 

        O fato de os filhos adultos não quererem mais viver com os pais e cuidar deles, ou de filhos trabalharem e não quererem deixar os pais idosos sozinhos também podem levar ao asilamento.


        O abandono se dá mais facilmente na velhice, quando o idoso não pode trabalhar. Perder o status de trabalhador é perder a consideração: não vale quem não produz. Perde o seu papel e, muitas vezes, se vê numa situação de dependência financeira, que deve ser suprida pelos filhos ou familiares mais próximos. Por isso pode ser excluído da família, desvalorizado, tratado com desrespeito.


É manifestação desse entendimento:
“Eu acho uma tristeza. O abandono é a pior coisa que existe. Um velho abandonado, não ter apoio dos filhos, de ninguém”. (H. B., 88 anos, domiciliada).

 

        Enquanto há saúde, maior a probabilidade da manutenção da independência e da autonomia, que proporcionam à pessoa mais facilidade e disposição para preencher seu tempo, manter relações sociais, realizar actividades pessoais. O fantasma do abandono fica mais distante. A doença, além de trazer sofrimento, provoca o estado de dependência e de inutilidade, a necessidade de cuidados e pode aproximar a possibilidade do abandono.
 

        Se a família não estiver fortalecida pela convivência e por laços afectivos, a presença da doença e das dificuldades dela advindas pode provocar tristeza, amargura, angústia, desânimo, melancolia e a constatação de que o abandono é algo cruel, injusto, ruim. Maltratar o idoso, deixá-lo sem apoio, passando por necessidades e sem alguém que cuide dele, é abandoná-lo.


        A longevidade pode trazer transformações negativas de ordem física, cognitiva, afetiva, social que levam à dependência e à falta de autonomia, condenando o indivíduo a perder a liberdade, a memória, familiares, amigos, afetos e relações.

                           
As falas assim se revelam:
“A partir do momento em que uma pessoa começa a dar trabalho, preocupação, depender de seus familiares, principalmente quando surgem doenças, esclerose e outras tantas coisas que aparecem por causa da velhice, isso incomoda demais os que são mais jovens e cheios de saúde” (V. P., 67 anos, domiciliada).
“Eu acho que a pessoa só é abandonada depois de velha, porque sendo nova trabalha, vive, escolhe, toma decisões. Depois de velho é diferente: não tem condições nem para trabalhar nem para viver” (A. T., 78 anos, institucionalizada).
“Abandono é perder o amor dos filhos” (A. P., 81 anos, domiciliada).
“A pessoa idosa sente-se abandonada quando na família não é tratada e tida como pessoa: excluída do convívio familiar, falta de amor, carinho, compreensão, ajuda” (F. P., 83 anos, domiciliado).

CONSIDERAÇÕES FINAIS ·       

 A reflexão sobre o abandono na velhice não se esgotam nesta análise. Aponta para um tema de fundamental importância nas relações estabelecidas entre os idosos e os diversos grupos sociais. Mostra que existem várias possibilidades para enfrentar o problema, tais como o envolvimento da família nas relações com seu idoso, a consciência da sociedade, a preparação para envelhecer e as acções sociais eficazes, fruto de políticas públicas e sociais.
 

        As dificuldades encontradas foram muitas para a produção deste texto, mas a experiência do estudo comprova a necessidade de pesquisar sobre temas que dizem respeito ao envelhecimento humano e suas implicações individuais e sociais. Muitas das dificuldades se originaram pelo fato de alguns idosos negarem a condição de sofrimento por ser velho, a dor de ser sozinho e a solidão.
 

        Outras dificuldades se relacionaram com o tema que poucos se dispõem a tratar, pela angústia que significa enfrentar a dor da realidade, do abandono e dos motivos que o levam a tal situação. Também se observou a necessidade de manter a ilusão sobre o assunto, já que a realidade em suas múltiplas faces é cruel, sarcástica, irónica e perversa.
 

        O ineditismo do estudo é atribuído ao tema e ao método. Ao tema, pela necessidade de compreender e enfrentar o processo de envelhecimento, o fenómeno do asilamento e as manifestações do ser humano velho. Ao método, pela oportunidade de sistematizar qualitativamente os sentimentos que os idosos têm acerca do abandono.
 

       

 

 Essas reflexões encontram eco no documento Carta aos Anciãos, do Papa João Paulo II (2000, p. 22), quando diz: “[...] o lugar mais natural para viver a condição de ancianidade continua a ser aquele ambiente onde ele é ‘de casa’, entre parentes, conhecidos e amigos, e onde pode prestar ainda algum serviço. [...] é urgente promover esta cultura de uma ancianidade acolhida e valorizada, não marginalizada. O ideal é que o ancião fique na família, com a garantia de ajudas sociais eficazes, relativamente às necessidades crescentes que supõem a idade e a doença”.

2010  Centro de Referência e Documentação sobre Envelhecimento, da Universidade Aberta da Terceira Idade - UnATI, Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ

https://www.unati.uerj.br/tse

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